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A 1ª edição 2012 da Angola'in é pura sedução! Disponível em Angola e Portugal, a revista marca o seu regresso ao bom estilo das divas: com muito glamour e beleza. Uma aposta Comunicare que reserva grandes surpresas para os seus leitores

terça-feira, 21 de julho de 2009

No fim do mundo


Deambulo pelo fim do mundo. Numa

experiência a solo, sinto que o deserto

quer engolir-me. Recuo, avanço, avanço,

recuo… Entre o medo e a excitação vivo

encontros com horizontes infinitos,

assisto ao movimento do sol e aos céus

cambiantes. Contemplo uma terra que

se faz ao Atlântico numa relação sem

obstáculos, embalados pelo vento.

Curoca, Arco, Tombua e tantos outros.

Nomes… Quebrando a monotonia, são

sinónimos da surpresa de encontrar

presença humana ou vestígios da

mesma no meio desta aridez imensa.

Primeiro uma casinha abandonada,

depois uma linha férrea e o barco do

pescador. E os sorrisos. E o espanto!

O espanto do cruzamento com

esta cara pálida em terras alheias

tirando fotografias. “Aqui! Aqui!”

Gritam alegremente e fazendo poses,

imploram por aparecer numa fotografia

que os levará longe!










Planeta Ásia

Os asiáticos olham para os europeus como

pontes para os mercados e daí a procura

de alianças, de fusões e de aquisições



Tsunami asiático

O mundo actual está a passar por uma importante etapa de transição. A frase é repetida diariamente, sem que com isso se perceba, muitas vezes, o que está prestes a mudar. No entanto, urge saber que a próxima fase provavelmente deslocará o centro da economia mundial do oceano Atlântico para a Ásia. Ela mudará a composição da produção e do comércio mundial, a maneira pela qual o mundo utiliza os recursos e a constituição das populações da Europa e dos EUA. É quase certo que criará graves tensões com as economias que hoje lideram o mundo, à medida que estas forem sendo desafiadas na sua predominância económica global. Hoje os EUA e a Europa representam cerca de dois quintos da produção económica global, que soma USD 40 triliões. Até 2025, o número global total poderá aumentar 2 ½ vezes, indo a USD 100 triliões. A China e a Índia deverão representar perto de dois quintos desse número. A China, com um PIB de USD 25 triliões em 2025,



medido em termos da paridade do seu poder aquisitivo, provavelmente será a maior economia do mundo, seguida pelos EUA com USD 20 triliões e a Índia, em terceiro, com aproximadamente USD 13 triliões. Essas projeções estão baseadas nas taxas de crescimento de longo prazo; não está além da capacidade da China crescer a uma taxa de 6% ao ano durante os próximos 25 anos (ela tem crescido a uma taxa maior nos últimos anos). Depois de apresentar uma taxa de crescimento anémica de 3,5 % ao ano por mais de três décadas após a independência, a Índia ainda precisa fazer muito para conseguir se emparelhar. Serviços de saúde e sectores como as novas tecnologia da informação contribuirão em pelo menos um ponto percentual para elevar a taxa de crescimento da Índia. Contudo, tendo populações acima de um bilião de pessoas cada, esses dois países criarão



turbulências à medida que as suas economias forem acelerando. As economias dos tigres do Leste asiático avançaram de forma rápida, mas imperceptível. As economias-elefante da Ásia, em contraste, causarão comoção global assim que começarem a disparar. A sua dimensão é que as colocará à frente das outras economias. E os seus tamanhos é que exercerão um efeito palpável sobre a economia global. Uma taxa de crescimento de 6% ao ano sustentada durante 25 anos elevará o crescimento global de menos de 3% ao ano, durante os últimos 25 anos, para mais de 3,5% nos próximos 25. A maioria desse aumento virá da indústria; por muito tempo, a composição da produção mundial esteve em mudança, à medida que as economias dos EUA, Europa e Japão avançavam na direcção do sector de serviços e se afastavam da agricultura e da produção industrial como principais componentes do PIB. A produção mundial estava-se a tornar mais leve, consumindo menos insumos materiais. Isso mudará assim que a China e a Índia assumirem a liderança. Pela primeira vez na história, duas das três maiores economias também estarão entre os países mais pobres em termos da incidência de pobreza absoluta. China e Índia terão uma população conjunta de

cerca de 3 biliões de pessoas até 2025, 500 milhões das quais ainda viverão abaixo da linha de pobreza. Elas necessitarão de imensas quantidades de comida e de outros itens essenciais.

Para atender às suas necessidades, ambos deverão continuar a enfatizar a indústria e a agricultura.

Assim, a produção mundial começará a ficar mais pesada. As consequências para o

aquecimento global podem ser devastadoras. É por isso que a comunidade internacional deve assegurar que a China e a Índia utilizarão os recursos responsavelmente. Também ocorrerão

grandes mudanças demográficas. Com as suas economias em crescimento acelerado, China e Índia irão dispor de recursos para investir na educação e ensino de milhões de cidadãos. Assim, terão um suprimento suficientemente grande de pessoas com as qualificações exigidas pelos sectores baseados em conhecimento dos EUA e Europa. Enquanto isso, o Japão e a Europa começarão a sentir um decréscimo das suas populações. Isso criará uma demanda generalizada por trabalhadores especializados vindos do exterior, que China e Índia terão condições de fornecer em abundância. O que estamos prestes a testemunhar, portanto, não é simplesmente mais um período de emparelhamento.

Assim que as economias-elefante começarem a avançar rapidamente, redefinirão a economia mundial que conhecemos.


É na base do “dumping social” que os países em vias de desenvolvimento beneficiam de uma posição favorável, mas indigna, face aos países mais ricos, pois passam por cima de alguns direitos humanos básicos



O assalto final

Os grupos económicos e as start-ups tecnológicas da Ásia estão numa nova vaga de internacionalização.

A palavra de ordem é “go global” e os alvos não são só os países do Terceiro Mundo - mas os mercados da OCDE. China e Índia levam a dianteira. E, paradoxalmente, a face da liderança começa inclusive a mudar para caras ocidentais à frente de marcas asiáticas de referência. Um conjunto vasto de empresas chinesas, estatais e privadas, assumiu a directiva oficial do “go global”. A lógica da exportação chinesa para o contentor já não entusiasma, apesar de ser a imagem de marca que os ocidentais retêm ainda hoje. A globalização tornou-se a palavra de ordem para as empresas chinesas que aspiram passar de campeões nacionais a jogadores globais. E, por isso, é natural que passem a mostrar a sua ambição global. Os ocidentais, por exemplo, dão-se, cada vez mais, conta que não há apenas um sentido - o da deslocalização das empresas europeias e norte-americanas para a Ásia, paraíso do fabrico barato de mercadorias. Há a direcção inversa: os asiáticos olham para os europeus como pontes para os mercados e daí a procura de alianças, de fusões e de aquisições. Também é erróneo o olhar ocidental que se limita ao “offshoring” de serviços de baixo valor. Hoje, a Ásia é um local de testes em diversas áreas das novas gerações de telecomunicações e uma região importante para a própria Investigação & Desenvolvimento em geral. A combinação ganhadora define-se numa fórmula: custo baixo do talento asiático para serviços de alto valor acrescentado.




‘Dumping social’ selvagem

Muitos arautos da “consciência social” têm vindo a público expor a indignidade do “dumping social” nos países em vias de desenvolvimento (PVD). Quando um PVD exporta determinado produto com grande competitividade, e quando esta vantagem assenta no aproveitamento de trabalho infantil ou no espezinhamento de garantias fundamentais dos trabalhadores, tal situação enquadra-se no que se convencionou chamar “dumping social”. Estes países fazem tábua rasa de certas garantias do ser humano que são o património genético de qualquer civilização. Só porque passam, muitas vezes, por cima dessas garantias é que estão em condições de beneficiar de uma competitividade acrescida no mercado internacional. Logo, são têm sido frequentemente acusados de fazer concorrência desleal com os países mais avançados, onde aquelas garantias sociais são respeitadas. Os PVD são culpados de resvalar para o “dumping social”, aproveitam-se de uma batota

indigna que os favorece no comércio internacional. Para estes infractores de uma ética mundial unidimensional, o problema está na negligência de um catálogo mínimo de direitos que ultrapassa a esfera do trabalhador e repousa na pessoa humana. Acham que é impensável que nos alvores do século XXI certos países se possam aproveitar de trabalho infantil. Consideram indignas as condições de trabalho a que os trabalhadores destes países se expõem. Fazendo parte das conquistas inalienáveis dos trabalhadores, representando um capital inquebrantável dos padrões civilizacionais, tais garantias deviam-se estender a todo o mundo. Seria um sinal inequívoco de civilidade, um sinal bem claro de um mundo mais justo para com o ser humano enquanto agente produtivo. No entanto, até hoje boa parte do mundo tenta perceber se estes arrufos contra o “dumping social” são genuínos ou se as pessoas actualmente se agarram a um putativo dever de consciência para denunciar tais situações, fazendo-o de forma desinteressada. Ou ainda se são motivadas por outros interesses que se escondem neste pretexto. O que é igualmente indigno. No primeiro caso, temos os líricos que acreditam piamente que a justiça social se pode estender num manto uniforme aos quatro cantos do planeta. Independentemente dos diferentes hábitos, das diferentes condições estruturais, sabendo que ambas as realidades se movem contra a possibilidade

de se ter nos países asiáticos e africanos a mesma bitola de justiça social que é empregue no mundo ocidental. Num mundo tão diverso, com uma acentuada diferença de costumes sociais, é intrigante como se pode ter a ambição de estender padrões uniformes a todo o mundo. Como se a bitola pela qual se rege o ocidente fosse necessariamente aplicada noutras paragens, mesmo quando a idiossincrasia destes locais é suficiente para negar a aplicação desses padrões. É a tendência etnocêntrica que domina o mundo contemporâneo, um dos seus grandes males. Para além desta cegueira, muitos dos defensores da eticidade mundial agarram-se a interesses próprios para erguer o dedo acusador contra o “dumping social”. Porque, afinal, é na base do “dumping social” que os PVD beneficiam de uma posição favorável a expensas dos países mais ricos. Falta saber até que ponto são genuínas as lamúrias de tantos quantos protestam contra o “dumping social”. Será porque manifestam uma honesta preocupação pelo desrespeito de garantias essenciais do ser humano? Ou apenas porque o “dumping social” penaliza a economia nacional? Aqui vem à superfície, muitas vezes, uma inconfessada hipocrisia que atenta contra a ambição de quem patrocina uma consciência social uniforme.

África

Yes We Can África




Com pompa e circunstância, Barack Obama foi empossado o 44º presidente dos EUA. Um momento inédito por ser o primeiro negro americano a assumir os destinos da mais poderosa nação do planeta. No entanto, quem sabe quais os planos que o mesmo tem para África, continente onde tem radicadas as suas raízes familiares? Americanos de todas as raças e idades têm manifestado uma genuína satisfação e um profundo orgulho por esta conquista, que não é mais do que o reflexo do progresso que fizeram como nação, assente na sua própria diversidade. O mundo tem, desde então, partilhado a emoção de um acto que parece ter aberto novas perspectivas. O slogan “Yes we can” transcendeu as fronteiras americanas e passou a ser pertença de todos aqueles que, na comunidade internacional, acreditam nele como uma força motriz. O Obama, negro americano, já faz parte da história. O Obama, presidente, tem um caminho para percorrer e uma história para escrever, cujo sucesso dependerá da sua capacidade de liderar e das circunstâncias envolventes. O facto de Obama ser filho de pai queniano, criou naturalmente expectativas sem precedentes sobre os benefícios que a África poderá lograr da sua administração. Enquanto, os governantes esperam maior cooperação, os governados, sobretudo aqueles que vivem

em países onde persiste a ditadura, esperam do seu Governo a promoção do respeito pela vida, dos direitos humanos e da utilização responsável dos recursos naturais. No entanto, a verdade é que Obama foi eleito para promover e defender os interesses do povo americano, que obviamente nem sempre serão coincidentes com os interesses dos povos africanos. Assume a liderança do país num período de crise económica internacional com uma gravidade particular para o mercado de emprego e num momento em que a luta contra o terrorismo e as guerras do Iraque e Afeganistão continuam a ocupar as atenções do Executivo. Uma realidade que ditará uma hierarquia de prioridades que poderá relegar as expectativas dos governados no continente africano para segundo plano.


A sua administração vai procurar dar mais ênfase às políticas bilaterais em detrimento de uma “política africana”, acabando gradualmente com a tendência de olhar para África como um grande país subsidiário


Nova política americana para o continente

Analistas mundiais garantem estarmos diante de uma ligeira viragem na política americana para o continente africano. No seu discurso de empossamento, Obama disse “…para aqueles que se agarram ao poder através da corrupção, do engano e da eliminação da oposição…estais do lado errado da história…estender-vos-emos ajuda se estiverdes dispostos a abrir a mão (abandonar a governação musculada)”. Os peritos africanos que integram a equipa de Obama, definem os objectivos da sua política de acordo com diferentes metas, sendo as mais importantes a aceleração da integração do continente na economia global, o reforço da paz e da segurança dos Estados africanos e a promoção de relações mais estreitas com governos, instituições e ONG’s comprometidas com a democracia, a boa governação e a redução da pobreza em África. Obama tem conhecimento pessoal da vida no continente, o que cria maior sensibilidade e compreensão dos problemas. Será talvez o primeiro presidente americano em posição de indicar países africanos com as respectivas capitais. A sua administração vai procurar dar mais ênfase ao aprofundamento

de políticas bilaterais em detrimento de uma “política africana”, acabando gradualmente

com a tendência de olhar para África como um grande país subsidiário. Neste contexto, crê-se que a procura e a oferta ditarão as iniciativas.


AFRICOM

O combate ao terrorismo será conduzido através do ênfase atribuído ao combate à pobreza e à promoção da estabilidade política, em sincronia com programas do AFRICOM. Este organismo, bem como as suas actividades, será objecto de maior consulta com os países africanos a fim de elevar o diálogo sobre segurança colectiva e objectivos a alcançar no quadro da paz, segurança e estabilidade. A administração Obama tem também a intenção de transferir o comando do AFRICOM para território americano, tornando-o independente do EUCOM. O seu Governo procurará maior concertação com o governo chinês no que diz respeito às respectivas políticas africanas. O objectivo é o de cultivar a complementaridade no quadro de uma “competição saudável”. De acordo com alguns dos exemplos divulgados pela sua administração são vários os

países-alvo da atenção americana. No Sudão a estratégia é aumentar a pressão sobre o Governo de Khartoum no sentido de parar o conflito e permitir a evolução da força da paz da ONU. Na República Democrática do Congo, apoiar a força de manutenção da paz da ONU, MONUC e impor metas mensuráveis ao processo “tripartido +” (DRC, Rwanda, Burrundi e Uganda) de forma a garantir o progresso e a segurança. No Zimbabwe, exigir que o acordo de partilha de poder se altere tão rápido quanto possível de um governo controlado por Mugabe para um que reflicta as eleições de 29 de Março. Exigir ainda que Mugabe permita a reabertura das actividades das ONG’s para socorrer os milhões de cidadãos com bens alimentares e medicamentosos. Repletos de intenções, estes enunciados reflectem maior equilíbrio político, o que seria construtivo para o continente se forem, efectivamente, aplicados.

Contudo, como todas as anteriores administrações, está irá cedo descobrir que nem sempre os ideais convergem com os seus interesses. A prossecução de uns ou de outros, em dadas circunstâncias, determinará a diferença entre este Governo e os outros. Do lado africano, os líderes têm a oportunidade de proceder a reformas democráticas e a implementar políticas inclusivas de desenvolvimento sócio-económico, não para impressionar outrém, mas para dinamizar as economias dos seus países, no interesse dos seus respectivos povos. Finalmente poderão assimilar que políticas de investimento e que práticas de negócios que não facilitam cidadãos nacionais, tão pouco facilitam investidores estrangeiros, criando uma situação de apatia internacional.

Por seu turno, países que tiverem governos transparentes, sociedades capazes de respeitar todos os seus cidadãos e oferecer-lhes igualdade de oportunidades, estarão em melhores condições de explorar os benefícios da globalização, integrar a economia global e influenciar políticas de cooperação mutuamente benéficas que tão bem caracterizam o século XXI. Nesse sentido, o empossamento histórico de Obama, em si só, não fará milagres, pois não será suficiente para trazer benefícios à cooperação bilateral com países africanos que não se adaptarem política e economicamente aos novos tempos.


EUA em Angola

A presença americana no país tem-se notado em vários sectores. O auxílio na desconcentração do Poder Central de Luanda para as províncias e para os municípios tem sido disso exemplo, uma vez que um dos principais objectivos é ajudar as autoridades angolanas a diversificar a sua economia, priorizando a agricultura na produção de banana, batata e café. De facto, a administração americana

destacada tem procurado viabilizar uma importante injecção de crédito para o sector agrícola, bem como demonstra em continuar a ajudar no sector da desminagem. Os representantes no país acreditam que o desenvolvimento de Angola vem com o investimento externo e interno em sectores não petrolíferos e do gás. Uma ideia a que Obama já fez também alusão. O presidente traçou para o

país um programa para captação de capitais que permitam a aquisição de sementes que vão impulsionar pequenas e médias empresas agrícolas para Angola. No campo político, o objectivo é fortalecer as instituições parlamentares, encorajar a existência de um sistema judicial independente, uma comunicação social isenta e uma sociedade civil forte. No domínio da segurança, os Estados Unidos reconhecem o papel estratégico de Angola na preservação da paz e da segurança na parte

Central e Sul do continente africano. O país possui um dos melhores exércitos de África e estas forças armadas podem jogar um papel importante na pacificação do continente.

Capitalismo


Morte do Capitalismo?



Analistas mundiais esperam por um reforço da regulação, mas o sistema não está em perigo.

As notícias que davam conta da morte do capitalismo na sequência da crise global que tem vindo a alastrar ao planeta como um fogo incontinente têm-se revelado não apenas prematuras, como infundadas. O sistema - que o génio humano criou de improviso ao mesmo tempo que inventava a máquina a vapor - está saudável como um mancebo, a carregar as baterias para o próximo par de décadas e, quando muito, a precisar de uns retoques na regulação. Não é fácil encontrar um economista que saia da órbita deste registo, e mesmo aqueles que de algum modo acordaram o fantasma de Karl Marx da sua campa londrina, tê-lo-ão feito mais por desfastio - ou porque o empirismo da coisa tinha graça - que propriamente por convencimento. O capitalismo “está aí para ficar”, disse recentemente um dos maiores gurus mundiais da gestão, o indiano Ram Charan. “Apesar dos seus excessos”, salientou. Excessos?

Talvez antes crises de crescimento, uma vez que tudo isto não é mais do que uma forma do próprio sistema incorporar as novidades que a sua vitalidade vai criando nas bolsas de inovação (aliás, historicamente incontroláveis). Mas, contrapõem os que anunciam a morte do capitalismo, os Estados intervieram com radicalismo, nomeadamente nacionalizando empresas - com destaque para o sector financeiro. E então? Desde a sua génese, o capitalismo assentou sempre (e defendeu quando isso estava em causa) em Estados fortes e interventivos. Razão pela qual, vários economistas continuam a defender a ideia de que o Estado deve voltar a ser forte nas funções que lhe competem, designadamente na regulação da economia, na regulação financeira e na educação, entre outros sectores.

Alertam por isso para a importância de uma regulação que esteja à altura do desenvolvimento da economia e que o Estado saiba fazer cumprir. Quanto ao restante, tudo na mesma: os paradigmas em que o capitalismo se baseia - a propriedade individual, a livre iniciativa, a democracia e o Estado social - não sofreram qualquer alteração, pelo que o sistema [capitalista] não está em causa, mesmo que o mercado, afinal, não chegue para equilibrar todas as forças que lhe dão vida. O capitalismo, no que tem de matricial (propriedade privada dos meios de produção; relação salarial como relação de trabalho fundamental; regulação pelo mercado; lucro como principal motivação para o investimento), não mudou, afirmam os grandes analistas. No entanto, encontra uma clara necessidade de reorientação: não se sairá dela [da crise actual] sem modificações. A mais importante residirá sem dúvida na componente regulatória da actividade financeira: obrigações de maior transparência, exigência acrescida de rácios que protejam credores e accionistas minoritários,



muito provavelmente, recuo acentuado nos privilégios garantidos por instituições como as ‘off-shores’ ou o segredo bancário, anunciam. Segundo essa linha de raciocíno, o capitalismo não morreu porque não dá sinais de estar em coma nem em regime de respiração assistida. Ao contrário, está em fase de crescimento e de agregação daquilo em que ele próprio, o capitalismo, transformou o

mercado. Mas resta ainda uma incógnita: que resposta da sociedade civil à crise global? É o que no futuro se verá.


Os paradigmas em que o capitalismo se baseia - a propriedade individual, a livre iniciativa, a democracia e o Estado social - não sofreram qualquer alteração, pelo que o sistema [capitalista] não está em causa, mesmo que o mercado, afinal, não chegue para equilibrar todas as forças que lhe dão vida


Economia multipolar

A crise tem vindo a fazer emergir um mundo multipolar. Senão vejamos: o que é feito do antigo mundo do G8? A centralidade da recente cimeira dos G20 é um facto novo. Traduz uma mudança de fundo não só na economia mundial mas também na cena internacional, a “ascensão do resto”, na expressão do americano Fareed Zakaria. A eclosão da crise financeira foi o acelerador. O G20 foi montado em 1999 após a crise económica asiática. Tratava-se de um fórum mais alargado do que o G7 (depois G8, com a Rússia), mas com um papel acessório. Com a crise financeira, deu um salto de qualidade: o G20 de Washington, em Novembro, já reuniu chefes de Estado e de governo, em vez de ministros das Finanças. No entanto, o vazio de poder nos EUA, no fim do mandato de Bush, reduziu o seu alcance, embora tivesse feito um diagnóstico das origens da crise, proposto medidas e agendado a recente cimeira de Londres. O relevo desta cimeira decorre em parte do apelo de Barack Obama a que os líderes dos 20 adoptassem uma “acção audaz, global e coordenada”, não apenas em relação à recuperação imediata, mas também em direcção a “uma nova era económica” que previna crises como a actual. A cimeira pode até ter desiludido, mas já produziu um efeito: a marginalização do G8, clube exclusivo dos antigos “grandes”, todos ocidentais à excepção do Japão, e a afirmação dos países “emergentes”. É a constatação de duas realidades. A China, a Índia ou o Brasil, as três economias que mais rapidamente cresceram nos últimos anos, estão fora do G8. A segunda é mais pesada: a crise mundial, iniciada na América, só pode vir a ser resolvida na base de uma estreita cooperação entre os EUA e a China. Há muito que os economistas falam na emergência de novas potências e, sobretudo, no movimento de transferência dos centros de riqueza e poder do Ocidente para a Ásia. Esta tendência foi travada pela crise asiática de 1997 e obscurecida pela ilusão de um mundo unipolar sob hegemonia dos Estados Unidos. Este foi um dos



grandes temas do debate americano durante o segundo mandato de George W. Bush. A última manifestação foi o relatório de prospectiva dos serviços secretos americanos publicado em Novembro passado - Global Trends 2025, a Transformed World - onde se constata: apesar de os Estados Unidos permanecerem a principal potência, a dominação americana será severamente

reduzida e será acelerada a erosão da supremacia americana “nas áreas política, económica e, possivelmente, cultural”. A crise forçou o debate sobre os grandes símbolos da dominação americana. Continuará Wall Street a ser a capital financeira do mundo? Qual o destino do dólar? Conservarão os EUA o domínio nas tecnologias de ponta e nas indústrias culturais? O jornalista Fareed Zakaria popularizou a expressão “a ascensão do resto” (The Rise of the Rest): é inevitável uma redistribuição do poder em todas as dimensões, industrial, financeira e cultural, que limitará a

dominação americana e conduzirá a um sistema multipolar. Não se trata propriamente de retomar as ideias de George Kennedy sobre a “A Ascensão e Queda das Grandes Potências” (1987), mas de constatar a emergência de novas.

O Global Trends 2025 sublinha exactamente a ascensão de uma nova “ordem global multipolar”, em que potências como a China e a Índia superarão economicamente a maioria dos velhos membros do G8. Os EUA sabem que se o seu poderio assentou numa economia pujante, as futuras potências económicas não se limitarão a ser ricas mas desejarão também ser “poderosas”. Um geopolítico americano, Parag Khanna, antevê um mundo organizado em torno de “Três Grandes”, EUA, China e União Europeia, mas em que dezenas de países, do Sueste Asiático à América Latina, passando pela

Turquia, ajudarão “a moldar a globalização”.


Nova era americana

A nova administração americana foi colocada perante um desafio: ou os EUA aceitam e tentam moldar o novo mundo multipolar, reconhecendo os limites do seu poderio, ou correm o risco de lançar o caos na ordem internacional. A crise não deixou alternativa a Obama, que assumiu a realidade para recuperar a iniciativa, o que em princípio lhe concede uma posição de vantagem. O mesmo fez a China. Não tem alternativa à cooperação com os Estados Unidos. Mas tomou nota da nova realidade, da rápida subida do seu estatuto, passando a tratar com Washington de igual para igual, do futuro do dólar à redistribuição do poder no FMI. Os grandes perdedores serão seguramente as economias com menos capacidade de adaptação. A Rússia é o exemplo do mais provável desastre. As economias capitalistas “centrais” estão já a debater a sua “reconversão”. A começar pelos EUA. Também a maioria das economias asiáticas, duramente flageladas, parecem ter condições para “sair por cima”. A China prepara-se para acelerar uma viragem, já esboçada, mas travada pela primazia absoluta da exportação: alargar intensivamente o mercado interno e reforçar a aposta numa produção industrial de elevada tecnologia. Visto da Europa, o crescimento asiático parece essencialmente fundado nas exportações, diz o especialista francês Jean-Raphael Chaponnière. Mas a ênfase neste aspecto “oculta o essencial: o crescimento asiático assenta muito mais na procura doméstica”. É cedo para conhecer a saída da crise. Mas, ao “acelerar a viragem para a Ásia, a crise será o parto de um mundo multipolar”, conclui. Dois dos autores do Global Trends, Mathew Burrows e Jennifer Harris, sublinham, por outra via, o mesmo aspecto. “A própria globalização será transformada pela crise financeira.” A China é obrigada a voltar-se para o seu imenso mercado interno, o que, entre outros efeitos, provocará o crescimento e o reforço do papel das suas classes médias.


Ascen são do resto

Se, graças à crise financeira, o G20 destronou o G8, já “a ascensão do resto” na ordem política fia mais fino. O Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, David Miliband, quis convidar para uma reunião paralela à cimeira os 15 do Conselho de Segurança da ONU, a fim de discutirem a proposta do seu alargamento a 21 membros, lançada pelo Brasil, Alemanha, Japão e Índia. A China e os EUA disseram que não. “Os chineses mataram [a proposta] e os americanos não foram muito positivos”, disse um diplomata do Conselho de Segurança. Motivo pelo qual se espera com grande expectativo o desenrolar dos próximos acontecimentos.