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terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Comércio




O preço justo





Certamente já ouviu alguém dizer que “o preço justo é aquele que o cliente se dispõe a pagar”.



Uma frase habitual em situações comerciais, tida como um instrumento de venda, que sugere que os produtos devem ser comercializados pelo preço mais alto possível, no limite da disponibilidade e interesse dos seus consumidores. Quando há margem para negociar com os clientes até poderá fazer sentido. Não é, no entanto, o que ocorre no âmbito do comércio internacional, marcado pela oferta de produtos superior à procura e pela alta volatilidade de preços. Num mercado como o actual, dominado por grandes corporações, quais são as hipóteses de sucesso de pequenas comunidades produtoras da zona rural da América Latina, África ou Ásia? Algo próximo a zero, obviamente. Como não têm volume no sistema de capital, estes agricultores têm restrições de acesso a crédito, o que os torna frágeis frente à variação dos preços. São pequenas propriedades e, portanto, não há como se defender com uma produção em larga escala. A escassez de recursos financeiros, por outro lado, impede a aquisição de novas tecnologias. O acesso à informação destes grupos é baixo, dificultando o desenvolvimento da organização de cooperativas que, na maioria das vezes, só ocorre mediante a assessoria de agentes externos, como as ONG’s, por exemplo. Os pequenos produtores são presa fácil para as grandes empresas, que compram os seus produtos a preços “injustos”, muitas vezes pagando menos do que o próprio custo de produzi-los. O resultado desta equação é o aumento da pobreza, miséria, violência e a degradação ambiental. Ora é neste contexto que se insere o Comércio Justo (Fair Trade), podendo ser encarado como uma ferramenta contra os malefícios de um sistema comercial injusto e socialmente excludente. Ao comprar produtos de comércio justo, o consumidor tem a garantia de que está a fomentar um cadeia comercial alicerceada em princípios éticos. Este é tido como uma forma de comercialização alternativa ao modelo proposto pelo capitalismo, que pressupõe exclusivamente a maximização de lucros, a despeito de outros valores e critérios. Tal interpretação, no entanto, perdeu sentido com a decadência das economias socialistas. Actualmente, o esquema de comercialização fair trade é visto como uma evolução natural do sistema capitalista, que, na esteira do desenvolvimento sustentável, pauta as suas relações pela ética, assimilando lucro e responsabilidade social. O comércio justo é, por isso, definido como “uma parceria de comércio baseada no diálogo, transparência e respeito, que procura um maior grau de igualdade no comércio internacional. Contribui para o desenvolvimento sustentável oferecendo melhores condições comerciais e protegendo os direitos de produtores e trabalhadores marginalizados, especialmente no hemisfério Sul”. Na prática, o fair trade funciona da mesma maneira que o comércio “normal”, uma relação de compra e venda como outra qualquer. A diferença é que as partes se comprometem a seguir determinados princípios, garantindo que os produtores não sejam “espremidos” em negociações comerciais.



Poder ao consumidor

O consumidor exerce um papel fundamental no comércio justo, pois é ele que garante a demanda destes produtos. Ao optar pelo fair trade, o consumidor tem a certeza de que comunidades socialmente excluídas não estão a ser injustiçadas nas transacções comerciais. Mas como ter certeza que os pequenos produtores estão a ser efectivamente beneficiados pelas garantias do comércio justo? A resposta a esta pergunta revela um dos grandes diferenciais do sistema. Para que o fair trade realmente funcione, é necessário o envolvimento de todos os actores da cadeia de comercialização - desde o pequeno produtor, até ao consumidor final, passando pelos importadores e exportadores, distribuidores e comerciantes.





As organizações de comércio justogarante mas “boas práticas” de diversas formas distintas. Por exemplo, adoptam o processo de certificação em cadeia, com auditoria realizada por organismo externo. É preciso que produtores, distribuidores e comerciantes sejam fiscalizados para que um produto chegue até às prateleiras dos supermercados com o selo oferecido pela organização. E para comercializar os produtos certificados, as organizações estabelecem o preço mínimo que o distribuidor tem de pagar aos produtores, independentemente das oscilações do mercado internacional. Esta imposição de preços deriva de estudos económicos realizados por técnicos da própria instituição e varia de região para região. Outra exigência é o pagamento de um “prémio social” aos produtores, ou seja, um valor adicional pago por unidade de produto comercializado, que é destinado a projectos sociais nas suas comunidades. Vários organismos têm vindo a desenvolver os seus processos de certificação, porém sem verificação externa. Embora sejam organizações sérias e comprometidas com os objectivos do comércio justo, com rígidos controlos de certificação, nem todas os mercados reconhecem isto como uma garantia efectiva. Há, ainda, organizações que se valem do seu histórico de conduta e na credibilidade das suas marcas para garantir o comércio justo. Um dos ícones desta prática é a cadeia de lojas inglesa The Body Shop, que ao contrário de outras organizações, não comercializa alimentos, e sim produtos manufacturados (cosméticos, perfumes, etc...). É possível também comprar produtos fair trade na Europa, com a garantia das “boas prácticas”, nos mais de 2.000 world shops espalhados pelo velho mundo.


Hora da mudança

Adoptar critérios meramente financeiros na escolha de produtos, simplesmente ignorando o caminho percorrido entre os campos e as prateleiras dos supermercados, nem sempre é a melhor alternativa, pois é vergonhoso tapar os olhos a eventuais abusos comerciais ou a práticas nocivas ao meio ambiente.Justificar completamenteSe é possível comprar café com a garantia de que quem o plantou e colheu foi remunerado dignamente, porquê escolher outro produto que não oferece as mesmas garantias? É uma qualidade a mais no produto, tão importante quanto o preço ou a higiene. Não é à tôa que o comércio justo é um movimento que cresce ano após ano, em níveis superiores ao Produto Interno Bruto (PIB) e que alcança dezenas de países em todo o mundo. Embora os produtos de comércio justo ainda não sejam tão conhecidos, já é possível encontrá-los e consumi-los. E para quem produz, há cada vez mais uma enorme procura de consumo no âmbito do comércio internacional.

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