O preço justo
Certamente já ouviu alguém dizer que “o preço justo é aquele que o cliente se dispõe a pagar”.
Uma frase habitual em situações comerciais, tida como um instrumento de venda, que sugere que os produtos devem ser comercializados pelo preço mais alto possível, no limite da disponibilidade e interesse dos seus consumidores. Quando há margem para negociar com os clientes até poderá fazer sentido. Não é, no entanto, o que ocorre no âmbito do comércio internacional, marcado pela oferta de produtos superior à procura e pela alta volatilidade de preços. Num mercado como o actual, dominado por grandes corporações, quais são as hipóteses de sucesso de pequenas comunidades produtoras da zona rural da América Latina, África ou Ásia? Algo próximo a zero, obviamente. Como não têm volume no sistema de capital, estes agricultores têm restrições de acesso a crédito, o que os torna frágeis frente à variação dos preços. São pequenas propriedades e, portanto, não há como se defender com uma produção em larga escala. A escassez de recursos financeiros, por outro lado, impede a aquisição de novas tecnologias. O acesso à informação destes grupos é baixo, dificultando o desenvolvimento da organização de cooperativas que, na maioria das vezes, só ocorre mediante a assessoria de agentes externos, como as ONG’s, por exemplo. Os pequenos produtores são presa fácil para as grandes empresas, que compram os seus produtos a preços “injustos”, muitas vezes pagando menos do que o próprio custo de produzi-los. O resultado desta equação é o aumento da pobreza, miséria, violência e a degradação ambiental. Ora é neste contexto que se insere o Comércio Justo (Fair Trade), podendo ser encarado como uma ferramenta contra os malefícios de um sistema comercial injusto e socialmente excludente. Ao comprar produtos de comércio justo, o consumidor tem a garantia de que está a fomentar um cadeia comercial alicerceada em princípios éticos. Este é tido como uma forma de comercialização alternativa ao modelo proposto pelo capitalismo, que pressupõe exclusivamente a maximização de lucros, a despeito de outros valores e critérios. Tal interpretação, no entanto, perdeu sentido com a decadência das economias socialistas. Actualmente, o esquema de comercialização fair trade é visto como uma evolução natural do sistema capitalista, que, na esteira do desenvolvimento sustentável, pauta as suas relações pela ética, assimilando lucro e responsabilidade social. O comércio justo é, por isso, definido como “uma parceria de comércio baseada no diálogo, transparência e respeito, que procura um maior grau de igualdade no comércio internacional. Contribui para o desenvolvimento sustentável oferecendo melhores condições comerciais e protegendo os direitos de produtores e trabalhadores marginalizados, especialmente no hemisfério Sul”. Na prática, o fair trade funciona da mesma maneira que o comércio “normal”, uma relação de compra e venda como outra qualquer. A diferença é que as partes se comprometem a seguir determinados princípios, garantindo que os produtores não sejam “espremidos” em negociações comerciais.
Poder ao consumidor
O consumidor exerce um papel fundamental no comércio justo, pois é ele que garante a demanda destes produtos. Ao optar pelo fair trade, o consumidor tem a certeza de que comunidades socialmente excluídas não estão a ser injustiçadas nas transacções comerciais. Mas como ter certeza que os pequenos produtores estão a ser efectivamente beneficiados pelas garantias do comércio justo? A resposta a esta pergunta revela um dos grandes diferenciais do sistema. Para que o fair trade realmente funcione, é necessário o envolvimento de todos os actores da cadeia de comercialização - desde o pequeno produtor, até ao consumidor final, passando pelos importadores e exportadores, distribuidores e comerciantes.
Hora da mudança
Adoptar critérios meramente financeiros na escolha de produtos, simplesmente ignorando o caminho percorrido entre os campos e as prateleiras dos supermercados, nem sempre é a melhor alternativa, pois é vergonhoso tapar os olhos a eventuais abusos comerciais ou a práticas nocivas ao meio ambiente.Se é possível comprar café com a garantia de que quem o plantou e colheu foi remunerado dignamente, porquê escolher outro produto que não oferece as mesmas garantias? É uma qualidade a mais no produto, tão importante quanto o preço ou a higiene. Não é à tôa que o comércio justo é um movimento que cresce ano após ano, em níveis superiores ao Produto Interno Bruto (PIB) e que alcança dezenas de países em todo o mundo. Embora os produtos de comércio justo ainda não sejam tão conhecidos, já é possível encontrá-los e consumi-los. E para quem produz, há cada vez mais uma enorme procura de consumo no âmbito do comércio internacional.
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