'Nova geografia económica'
Um renovado interesse na geografia económica está a nascer. A revolução que assentou nos rendimentos crescentes/concorrência imperfeita - fundamento dos modelos de crescimento endógeno, que transformaram a teoria económica das duas últimas décadas - vive hoje novos desafios. Findos as três primeiras fases desta revolução, marcada, primeiro, pela nova organização industrial que criou um conjunto de modelos de concorrência imperfeitos, segundo, pela nova teoria comercial, que utilizou tal conjunto para construir modelos de comércio internacional na presença de rendimentos crescentes e, por último, pela teoria do crescimento que aplicou todo este instrumental à mudança tecnológica e ao desenvolvimento económico, é tempo de entender a geografia económica, segundo Paul Krugman, Prémio Nobel de Economia (2008). Para o mesmo, este termo entende a localização da produção no espaço, ou seja, é o ramo da economia que se preocupa com “onde” ocorrem os negócios e se localizam as empresas. No sentido adoptado por Krugman, a maior parte da economia regional e algumas questões da economia urbana constituem a geografia económica. A teoria do comércio internacional, segundo ele, é um caso especial da geografia económica, onde as fronteiras e as acções dos governos desempenham um relevante papel na determinação da localização e distribuição espacial das actividades produtivas. Este investigador considera que as teorias do comércio, o crescimento e os ciclos económicos da década de 80 oferecem uma visão mundial da economia bastante distinta da que derivava do corpo teórico antecedente: concorrência perfeita, crescimento equilibrado e convergência da produtividade entre países. “Rendimentos crescentes de escala que se mantêm de forma permanente e concorrência imperfeita; equilíbrios múltiplos em todas as partes, e um papel cada vez mais decisivo para a história, os ‘acidentes’ [...]: essas são as ideias que se estão a tornar populares [...]”, referia Krugman já em 1992. A clara dependência da história, que caracteriza a localização da produção em todas as partes do mundo, é, para o Prémio Nobel, a prova de que a economia está mais próxima de um mundo dinâmico guiado por processos acumulativos, do que do modelo típico de rendimentos constantes de escala. Krugman tem procurado incessantemente demonstrar duas coisas: que os rendimentos crescentes têm, de facto, uma influência permanente na economia e que, quando se estuda a distribuição geográfica da produção nas economias reais, se percebe que os acontecimentos históricos desempenharam um papel decisivo na sua concretização. A sua posição sobre a influência dos acontecimentos ou “acidentes” históricos na concentração de empresas, tem como antecedente o “facto histórico fortuito” de Myrdal, indicado por este autor como a origem do poder de atracção de um centro económico.
Os rendimentos crescentes, conforme Krugman, afectam a geografia económica em vários âmbitos. No nível mais reduzido, a localização de sectores específicos reflecte algumas vantagens transitórias; num nível maior, a própria existência de cidades constitui um fenómeno visível da existência de rendimentos crescentes de escala; no nível superior, o desenvolvimento desigual entre regiões pode ser consequência de processos cumulativos enraizados nos rendimentos crescentes. No modelo de Krugman, a interacção entre a procura, os rendimentos crescentes e os custos de transporte são a força motriz desses processos cumulativos que acentuam as desigualdades regionais. No início do século XX, explica, os geógrafos deram-se conta de qua a maior parte da indústria dos Estados Unidos estava concentrada numa parte relativamente pequena da região Noroeste e da parte central do Meio Oeste, que se tornou conhecida como “Cinturão Industrial”, termo que, segundo Krugman, parece ter sido usado pela primeira vez por DeGeer (The american manufacturing belt, 1927). Durante a fase de apogeu do Cinturão, a maior parte da indústria que se concentrava no seu exterior, conforme explica, correspondia ao processamento de matérias-primas ou à produção destinada ao mercado local. Isto é, o Cinturão Industrial continha praticamente todas as indústrias “soltas”, ou seja, que não estavam ligadas a uma determinada localização nem pela necessidade de estar muito próximas do consumidor final, nem pela necessidade de utilizar os recursos naturais situando-se muito perto da sua fonte. Este facto tornava ainda mais expressiva a dimensão da concentração de empresas dentro e no entorno do Cinturão, salienta. Em meados do século XX, a maior parte das matérias-primas utilizadas pelas indústrias situadas na área do Cinturão era importada de outras regiões. Krugman questiona-se sobre o porquê de, mesmo diante dessa situação, uma parte tão considerável da indústria dos Estados Unidos ter permanecido localizada nesta pequena área de território do país. A resposta, para ele óbvia, era devido às vantagens proporcionadas por se estar próximo das demais fábricas instaladas no Cinturão, ou seja, uma vez estabelecido o Cinturão, nenhum fabricante individual teria interesse em se distanciar do mesmo. O economista atribui a uma questão central referenciada aos detalhes da história, a razão de se ter originado uma concentração geográfica dessa natureza. Nota-se na análise efectuada, fortes traços de similaridade à análise sobre a origem e existência dos clusters nos Estados Unidos e em outros países. Segundo este, as forças que incitam os empresários industriais a se agruparem residem nas externalidades da procura. No seu modelo, “a concentração geográfica nasce, basicamente, da interacção entre os rendimentos crescentes, os custos de transporte e a procura [...]”. Se as economias de escala são suficientemente grandes, cada fabricante prefere abastecer o mercado nacional a partir de um único local. Para minimizar os custos de transporte, elege uma posição espacial que permita contar com uma procura local grande. Mas a procura local será grande, precisamente na área onde a maioria dos fabricantes elegem situar-se. Deste modo, existe um argumento circular que tende a manter a existência do Cinturão Industrial [ou do cluster], uma vez que este tenha sido criado, explica. Krugman considera importante salientar que o aparecimento do Cinturão Industrial remonta a meados do século XIX. Ele utiliza este facto para contrapor os argumentos de que as economias externas e os processos cumulativos tenham assumido maior relevância nas décadas recentes por força da crescente importância da tecnologia. A concentração geográfica da indústria nos Estados Unidos, pontua Krugman, existiu muito antes do advento da era da informação. Com isso, ele conclui que não só não é certo que a economia na actualidade não se ajuste ao modelo convencional dos rendimentos constantes de escala, mas também que nunca cumpriu tal função. Reportando-se especificamente à análise económica da localização industrial, enumera três razões que identifica como favoráveis à concentração de uma actividade num determinado local.
- Graças à concentração de um elevado número de empresas de um ramo no mesmo local, um centro industrial cria um mercado conjunto para trabalhadores qualificados, que beneficia tanto os trabalhadores, como as empresas;
- Um centro industrial permite a provisão, em maior variedade e a um menor custo, de factores concretos necessários ao sector, que não são objecto de comércio;
- Devido ao facto da informação fluir com mais facilidade num âmbito mais restrito, que ao longo de grandes distâncias, um centro industrial gera o que se pode chamar, nas palavras de Krugman, de osmose tecnológica (technological spillovers).
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